Por Rochana Grossi Freire
Continuo vivendo de reticências… Digo isso porque jamais imaginei que esta volta à 359 Online fosse despertar tantos sentimentos e sensações que estavam aqui, guardadas lá no fundo, num lugar que nem eu mesma conhecia. Reviver este retorno há 20 anos de uma outra forma me fez lembrar de quem eu era, ou melhor, da construção de quem eu sou hoje.
A ideia de deixar em aberto, de falar sobre nossas inquietudes, me levaram sim de novo à nossa velha e boa Famecos. O cafezinho no bar, os cigarrinhos com as amigas Betina e Imara (minhas parceiras de vida até hoje), as aulas do Aníbal, do Stosch, do Régis, do Porcello, da Cristiane, do Brito e de tantos outros mestres que contribuíram para a nossa formação.
Lembro que na época eu só pensava em me jogar ao mundo. Pensava em seguir a carreira de jornalista internacional, quem sabe na televisão. Em outros momentos, a administradora de empresas que também morava dentro de mim falava mais alto. Vou empreender. Entre uma escolha e outra segui…me joguei ao mundo. Todos os planos ficaram em segundo plano. Me deixei simplesmente viver!
Nossa formatura aconteceu naquela noite quente de inverno em agosto de 2001. Sim, lembro que estava calor naquele dia, ou será que era o calor de estar realizando o sonho de me tornar jornalista? Acredito que um pouco de tudo. Aquela noite foi uma mistura de sensações, de expectativas de como seria dali em diante, de inseguranças quanto ao mercado de trabalho, de dúvidas em relação à escolha da profissão e de receio em estar partindo em poucos dias para minha primeira grande aventura.
A ida
Pouco mais de 10 dias após a tão esperada formatura, estava eu partindo para Nova York. Cheguei na Big Apple em 9 de setembro daquele ano. Cheia de inquietudes, querendo mudar o mundo e disposta a não mais voltar. Eis que então fui catapultada. Meus sonhos coloridos de uma jornalista iniciante foram arremessados, jogados no meio de toda a comoção norte-americana e mundial. É, essa foi a primeira sensação que tive ao viver aqueles momentos de profundo horror. No dia 11 de setembro, Nova York vivenciou o inesperado, e os Estados Unidos viveram o que foi o maior ataque terrorista de todos os tempos.
Passado o primeiro impacto, continuei minha caminhada. Me matriculei num curso de inglês, conheci pessoas do mundo todo, trabalhei em diversas atividades típicas de uma latina que vai morar em solo americano. Mas aqueles sonhos do jornalismo internacional, de viver no “primeiro mundo”, foram soterrados com as milhares de pessoas que morreram no 11 de Setembro.
A volta
Um ano depois, resolvi que era hora de voltar. Enfim, novamente em Porto Alegre. Foi o tempo de fazer um MBA em Marketing, abrir a RG Comunicação & Marketing e lá estava eu partindo novamente. Desta vez o destino era São Borja. Acreditem, foi quase uma ponte aérea entre dois planetas.
Trabalhava numa indústria de uma das marcas líderes de arroz do país como coordenadora de marketing. Estava realizada, aliava a minha formação de jornalista ao conhecimento adquirido em administração de empresas. Havia apenas um probleminha: morar num lugar em que muitos consideravam o fim do mundo dobrando a esquina! No verão, temperaturas que chegavam a 40 graus; no inverno, a apenas dois. Estradas horríveis, apenas um ônibus saía para Porto Alegre e não era todos os dias. O rio Uruguai, que divide Brasil e Argentina, passava por uma de suas maiores cheias: 13,5 metros acima do nível.
Ser jornalista numa cidade do interior é muito bacana. Tudo que se faz tem repercussão, mas estas nem sempre são tão positivas. As pessoas são muito próximas, todos são parentes em algum grau e quem não é parente é amigo de mateada, de caçar capincho (espécie de capivara), de pescar dourado, do mesmo piquete. Enfim, foram os melhores anos da minha vida como comunicadora. Aprendi que quem consegue se comunicar com o “homem do campo”, seja ele da indústria beneficiadora, seja ele da lavoura, consegue se comunicar com qualquer um.
Trabalhei para todas as empresas da cidade, desde arrozeiras, associações de classe, hospital, prefeitura, desenvolvi embalagens e marcas para quase todas as cerealistas, montei equipe de representação comercial, criei marcas de arroz, aprendi a logística de ponta-a-ponta desde o beneficiamento até a entrega no supermercado. Empreendi e abri um novo negócio por lá a Agro Service. Entendi que mesmo um commodity no segmento de grãos tem seus diferenciais, aprendi sobre as classificações do IRGA, 417, 422… E tudo isso sem saber cozinhar um arroz na panela, o que depois de tamanha imersão e uma filha para alimentar já faço com destreza! Aplausos!!!!
Nesta cidade, berço de trabalhismo, aprendi muito sobre política, sobre julgar e ser julgada por ser uma estranha no ninho. Durante o primeiro ano, me debati. Queria impor minhas ideias de cidadã do mundo para uma cidade de 60 mil habitantes. Até então não tinha entendido que tinha muito mais a aprender do que ensinar. Depois de algum tempo, fui me tornando uma pessoa um pouquinho mais sábia e adotei aquele velho e bom ditado: “Se não pode vencê-los, junte-se a eles”! A partir deste momento é que desfrutei de tudo que aquele lugar poderia me proporcionar para quem sou hoje como pessoa e profissional.
São Borja, obrigada por ter me recebido. Te devo eternamente muitos dos valores que tenho hoje!
Novos rumos
Em 2010, após seis anos, lá estava eu de mudança pronta rumo a Porto Alegre novamente. Mal sabia eu que seria por breves seis meses. No réveillon de 2010/2011 fiz uma viagem de uma semana para Fortaleza. Eis que lá encontrei meu companheiro de vida, meu amor, pai da minha Marina e com que divido os melhores momentos da vida nos últimos sete anos. E, mais uma vez, de malas sempre em ponto de bala, me mudei para Brasília.
Vivo hoje em Águas Claras, região administrativa do Distrito Federal de apenas 15 anos. Uma cidade com 700 prédios e apenas edificações deste porte. Não existem casas. São edifícios modernos, todos com muita infraestrutura e ao mesmo tempo com todo o aconchego e simplicidade das relações pessoais que se experimenta no interior. A temperatura aqui é amena, de noite em torno de 19 graus e durante o dia chega a 26, em média. Um chamam de “Manhattan do Cerrado”, olhem só as invenções dos brasilienses.
Desde 2012, sou consultora credenciada do Sebrae Nacional na área de marketing. Fiz pós-graduação em políticas públicas e gestão governamental. Desenvolvi alguns projetos para micro e pequenas empresas, redigi e editei publicações, desenvolvi cursos para a solução Vendas no Campo.
Em 2017, em meio a tantos escândalos de corrupção, lavagem de dinheiro, crise institucionais, protagonizadas na Operação Lava-Jato, resolvi também fazer parte deste contexto. Não como criminosa do colarinho branco, acalmem-se, mas como uma cidadã e profissional que quer viver numa sociedade mais justa e mais ética. Me submeti a duas certificações internacionais. Uma em Risk Management e outra em Anti-Bribery. Atualmente, sou sócia-fundadora da RP Management- Capacitação em Gestão de Riscos (www.rpmanagement.com.br).
Continuo vivendo de reticências… o que o futuro guarda para os próximos 20 anos? Para onde estes três pontinhos mágicos me levarão? Não sei, mas continuando vivendo a vida com o olhar de quem não vê um ponto final.